quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Buraco negro


Pretendia começar a poesia assim:

"... e toda a dor vem do desejo
de acabar a transa, antes
do bom começo -
sempre um fim que se liga
ao início,
sempre um círculo de angústias,
e sempre o mesmo desenrolar,
eu e alguém, uma outra vida,
um outro universo,
mais um buraco negro
a desviar a minha luz,
a comer as pontas
dos meus dedos,
a sorver
os meus sucos."

Mas faltou métrica,
e sobrou hipocrisia.
Estou perdendo a mão
(diria o seu Manoel,
meu finado pai).



















Ele já era velho,
era um bom marceneiro,
honesto portuga no meio
dos seus cavacos de madeira,
e seus formões e brocas.

Ele não era hipócrita.
Não sabia de buracos negros.
Jogava sueca.Tomava cerveja Malzbier
Fumava cigarros Lord Club
Usava à perfeição o esquadro, o meu velho...
Sabia o que era sucupira
sabia o que era cerejeira
e quão caro e difícil
era o mogno.

E amava a família
E amava a mulher, a Amélia
E amava a filharada
E me amava.

(De onde veio, então,
essa hipocrisia toda
que muita vez me assalta
só p'r'eu agradar o meu
próximo?)

Um comentário:

  1. ...a gente acha que alguem tem bom gosto quando o dele eh semelhante ao nosso... e, eu me encontrei tanto nessa poesia que quase foi eu quem a fez....

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